"Vamos dar de beber… à Dor"?
Em “Dia de São Martinho” é o que apetece, não?!
Mas não. Vamos beber, sim, mas ainda na Fonte da Bica e num texto original.
A Fonte da Bica: Descrição de J. Guerreiro da Purificação
«A Fonte da Bica»
«As nascentes vêm de duas minas do terreno do Senhor António Marques, ou seja, do chão que fica em frente quando se sobe a azinhaga onde está a arca, a pouca distância desta. Estas minas foram abertas pelo Senhor Joaquim Paté Caldeira (o Ti Torrado).
A arca desta fonte foi feita depois de ter havido um desastre na primeira. Um caso estranho e que passo a contar. A primeira arca da fonte estava construída no meio da azinhaga, um pouco mais acima da direcção da actual, mas soterrada para o trânsito ficar livre. Mas um dia aconteceu que uma vaca do Senhor José Durão, o antigo dono do terreno onde estão as minas, meteu as patas por entre os cascões de pedra que tapavam a arca. Depois, só com a ajuda de vários homens conseguiram tirar de lá o animal.
A Fonte da Bica, é das fontes da terra, a mais procurada pelo nosso povo. Há uns anos, antes de haver água canalizada e a Aldeia com mais povoação, a água desta fonte no Verão era todos os anos muito pouca, o que originava a tão maçadora “espera”.»
In. “A Nossa Terra” – Purificação, João Guerreiro da – Há Cultura / Associação de Amizade à Infância e Terceira Idade de Aldeia da Mata, 2000. Pag.s 146, 147.
(João Guerreiro da Purificação – Aldeia da Mata – 10/07/1927 – 17/12/1997.)
Continuo a divulgar as “Fontes de Aldeia”, ilustrando os postais com imagens globais ou parcelares das mesmas.
Divulgo igualmente textos do livro supracitado, de Autoria do “Senhor João”. Assim vou dando a conhecer parte do Património material e imaterial, referente a Aldeia da Mata. Estes textos contêm referências à localidade, reportando-se a um tempo muito diverso daquele que conhecemos hoje.
O “trânsito” referido reporta-se a carros movidos por tração animal: muares: machos, mulas, burros, burras e vacas. O episódio referenciado menciona uma situação dessas. Situar-se-á aí pelos anos trinta, quarenta, do séc. XX. Talvez! Até finais dos anos setenta ainda havia muitos carros puxados por tração animal. Os carros motorizados, em Portugal, só se generalizaram a partir da segunda metade desta década, mercê da melhoria generalizada das condições de vida, especialmente das classes trabalhadoras.
Outro termo citado, a “espera”. Refere-se ao facto de, no Verão, as nascentes das fontes serem mais fracas, pelo que corria menos água nas bicas. Como a procura era bastante, dado não haver água canalizada, as pessoas que iam às fontes, quase exclusivamente as mulheres, ficavam esperando, na respetiva “vez”, isto é, ordem de chegada, até que a água voltasse a correr na bica. Para encherem os cântaros, os asados, as infusas.
Lembro-me da instalação da água canalizada na Aldeia e da abertura de canos por todas as ruas. Corria o ano de 1966! A instalação dos esgotos ocorreu bem depois. Já nos finais de setenta ou inícios de oitenta. (Não me lembro com precisão.)
Mas não pense que estas situações de carências de bens e serviços que hoje consideramos básicos eram especificas das Aldeias. Eram comuns nas Cidades também. Atingiam proporções e condições ainda bem piores do que ocorria no Interior. Basta lembrar os “bairros de lata”, que enxameavam toda a Grande Lisboa!
Nos terrenos do supermoderno “Parque das Nações” existia a célebre “Lixeira de Beirolas”. Frisar que foi a “Expo 98”, que despoletou a requalificação de todo aquele espaço.
Só para lembrar este Portugal, ainda recente, que fomos!
Muito Obrigado e Muita Saúde!